Velhas Tristezas

Be still, my heart Por Sweetcharade
Diluências de luz, velhas tristezas
das almas que morreram para a luta!
Sois as sombras amadas de belezas
hoje mais frias do que a pedra bruta.

Murmúrios incógnitos de gruta
onde o Mar canta os salmos e as
rudezas
de obscuras religiões — voz impoluta
de todas as titânicas grandezas.

Passai, lembrando as sensações antigas,
paixões que foram já dóceis amigas,
na luz de eternos sóis glorificadas.

Alegrias de há tempos! E hoje e agora,
velhas tristezas que se vão embora
no poente da Saudade amortalhadas! ...
Cruz e Souza

Contudo

Olho por Cynthia Lamoglia
Contudo, contudo, Também houve gládios e flâmulas de cores Na Primavera do que sonhei de mim. Também a esperança Orvalhou os campos da minha visão involuntária, Também tive quem também me sorrisse. Hoje estou como se esse tivesse sido outro. Quem fui não me lembra senão como uma história apensa. Quem serei não me interessa, como o futuro do mundo.

Caí pela escada abaixo subitamente, E até o som de cair era a gargalhada da queda. Cada degrau era a testemunha importuna e dura Do ridículo que fiz de mim.
Pobre do que perdeu o lugar oferecido por não ter casaco limpo com que aparecesse, Mas pobre também do que, sendo rico e nobre, Perdeu o lugar do amor por não ter casaco bom dentro do desejo. Sou imparcial como a neve. Nunca preferi o pobre ao rico, Como, em mim, nunca preferi nada a nada.

Vi sempre o mundo independentemente de mim. Por trás disso estavam as minhas sensações vivíssimas, Mas isso era outro mundo. Contudo a minha mágoa nunca me fez ver negro o que era cor de laranja. Acima de tudo o mundo externo! Eu que me agüente comigo e com os comigos de mim.
Álvaro de Campos

Ser sem dono

Desfolho-me Por Kristina
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És livre e...
Voas lá no alto das serranias
Tens em ti a liberdade do condor
Acusaste e recusaste desde sempre
A canga e o jugo que tentaram impor.
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Tentaram fazer de ti um ser errante
Reduzir-te ao som das achas que no fogo entoam.
Desengane-se quem assim é ignorante
Porque és livre como a mais livre das águias
Que nos píncaros lá da minha serra voam.
Não conheces marcos nem fronteiras
És felina caçadora na pradaria.
Não gostas de masmorras ou ratoeiras
E gostas de Voar ao raiar do dia.
Tens em ti a mágua por curar
Duma época que pensas ser tardia,
Mas enquanto não esqueceres e perdoares,
Jamais sentirás como sentiste a maresia.
Sei que...
Somos composição da mesma lágrima
Somos o sol e a estrela que se finda lá na serra
Somos luz que cai dos nossos olhos
Somos por do sol que se estende na minha terra.
És livre e...
Contemplas lá do alto as pradarias
Os campos e as searas por ceifar
Procuras resguardar sempre o teu ninho
Que com a tua força no cume foste edificar.
Poisada lá no alto na ponta duma fraga
Sentes e consentes que o verão está a findar.
Pressentes com tristeza o odor do Outono
MAs que ninguém se atravesse no teu voar
Pois foste, és e sempre serás um ser sem dono.
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És do melhor que o mundo tem!
Furacão, sol e estrela polar,
Princesa, mulher e mãe.

Por António Maria